Petrobras: Como o governo costurou uma 'solução técnica' em 24 horas para trocar cúpula

 quinta, 07 de abril 2022

Petrobras: Como o governo costurou uma 'solução técnica' em 24 horas para trocar cúpula

Depois de ver seus indicados para presidência da Petrobras e para o Conselho de Administração da estatal — Adriano Pires e Rodolfo Landim —desistirem dos cargos por risco de conflito de interesses, o presidente Jair Bolsonaro buscou uma solução em quadros de seu governo, numa operação que incluiu até o inédito escrutínio do nome do indicado para dirigir a estatal em 24 horas.

José Mauro Ferreira Coelho, que foi apontado para assumir o comando da estatal, é considerado homem de confiança do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. Tem histórico de atuação em cargos da pasta e de estatais de energia e deve ter seu nome confirmado em assembleia geral de acionistas marcada para a próxima quarta-feira.

Bolsonaro também indicou Márcio Andrade Weber, que já é conselheiro da estatal, para presidir o Conselho de Administração da petroleira.

Para evitar o risco de que a nova indicação fosse vetada adiante pelo Comitê de Pessoas da Petrobras, o governo submeteu o nome de José Mauro a um inédito escrutínio de 24 horas, quando seu histórico e experiência foram alvo de um pente-fino. Albuquerque teve até reuniões com a Abin.

Em comunicado ontem, o Ministério de Minas e Energia indicou que a gestão da estatal não deve passar por grandes alterações. “O governo renova o seu compromisso de respeito à sólida governança da Petrobras, mantendo a observância dos preceitos normativos e legais que regem a empresa”, disse o MME.

Ele é um nome escolhido pelo próprio ministro, com aval de Bolsonaro. Ambos queriam afastar qualquer possibilidade de nova desistência ou críticas em relação às credenciais do novo candidato ao cargo. Por isso, foi escolhido um nome com perfil técnico, forte experiência no setor, incluindo estatais. Analistas elogiaram o conhecimento do setor, mas viram com ressalva a falta de experiência executiva.

Reunião com Abin
Bolsonaro também não queria, de acordo com fontes do governo, um nome bancado pelo Centrão, o grupo de partidos que o apoia e que deu aval à indicação de Pires. O martelo da indicação foi batido em reunião na tarde de terça-feira no Palácio do Planalto, entre Albuquerque e Bolsonaro. A demora na apresentação foi resultado da cautela em relação à checagem.

Antes do anúncio, o ministro se reuniu com integrantes da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. O órgão pode fazer checagens de indicados para cargos no governo.

O futuro presidente da estatal foi diretor da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), onde é funcionário concursado. Ele é bacharel em Química Industrial, mestre em Engenharia dos Materiais pelo Instituto Militar de Engenharia (IME) e doutor em Planejamento Energético pelo Programa de Planejamento Energético (PPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Em sua carreira, José Mauro acumula mais de 25 anos de experiência profissional, atuando nos setores de petróleo, gás natural e biocombustíveis. Ele atuou também, por vários anos, na área docente de graduação e pós-graduação, com três livros publicados e mais de 30 trabalhos científicos apresentados ou publicados em periódicos ou congressos nacionais e internacionais.

O governo indicou novos conselheiros para a Petrobras: Luiz Henrique Caroli; Carlos Eduardo Lessa Brandão e Eduardo Karrer. Além de Joaquim Silva e Luna, atual presidente da Petrobras, sairá do conselho o seu presidente, Eduardo Bacellar, e Cynthia Silveira. José Mauro entrará para o conselho porque todos os presidentes da Petrobras precisam fazer parte do órgão.

Indicado para a presidência do Conselho de Administração, Márcio Weber já faz parte do board. Ele chegou a ser cogitado para a presidência da empresa, mas, de acordo com integrantes do governo, não preenchia os critérios exigidos pela Petrobras e pela Lei das Estatais, por ser diretor da empresa Petroserv. Ele trabalhou por 16 anos na Petrobras.

A nova indicação ocorre após o consultor Adriano Pires declinar do convite para assumir a companhia em razão de conflito de interesses. Sua desistência colocou o governo diante de uma corrida contra o tempo para encontrar nomes para os dois postos mais importantes da estatal.

O atual presidente da estatal, Joaquim Silva e Luna, foi demitido do cargo na semana passada por insatisfação de Bolsonaro com o preço dos combustíveis.

O governo chegou a convidar o ex-diretor geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP) Décio Oddone para o cargo, mas ele recusou.

Foi a falta de experiência que afastou o secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Caio Paes de Andrade, da corrida para a Petrobras. Assessor do ministro Paulo Guedes, Andrade nunca atuou no setor, mas contava com a simpatia de Bolsonaro — de quem se aproximou com as negociações em torno do reajuste salarial a policiais federais. O risco de um novo revés, porém fez com que Andrade fosse preterido na escolha.

Weber: ‘preço é sensível’
Indicado para presidente do Conselho de Administração da Petrobras, Márcio Andrade Weber disse que recebeu “com orgulho” o convite para o posto. Ele afirmou ter recebido a informação de Albuquerque ontem.

— A única coisa que posso dizer é que sou conselheiro há mais de um ano da empresa. É uma atividade que, para mim… Eu acompanhei o antigo presidente nas reuniões de conselho, então para mim não é nenhuma novidade. É uma coisa que eu recebo com muito orgulho de me chamarem para ser presidente do Conselho da principal empresa brasileira — disse Weber ao GLOBO.

Ele irá substituir Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que pediu para deixar o conselho da empresa. Inicialmente, o governo nomeou o presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, para o cargo, que recusou posteriormente. Weber preferiu não comentar a política de preços da empresa, alvo do presidente Jair Bolsonaro e que levou à queda de Joaquim Silva e Luna da presidência da companhia.

— Preços é uma questão absolutamente sensível. Eu não vou te falar se tenho posição ou não tenho. A única coisa que quero dizer é que é um assunto sensível e tudo isso que está acontecendo demonstra isso. O meu pensamento eu reservo para depois — disse.

Fonte: O Globo