Para blindar teto de gastos, governo avalia trocar PEC dos Combustíveis por projeto de lei

 terça, 01 de fevereiro 2022

Para blindar teto de gastos, governo avalia trocar PEC dos Combustíveis por projeto de lei

O governo avalia alterar a forma de reduzir os impostos sobre os combustíveis para afastar qualquer possibilidade de “furo” no teto de gastos e blindar a regra que impede o crescimento dos gastos federais acima da inflação. Além disso, a proposta que o Palácio do Planalto negocia com o Congresso deve ser focada apenas na redução dos tributos sobre o óleo diesel e sobre o gás de cozinha — e não inclua, portanto, a gasolina.

Nessa segunda-feira, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), confirmou que a proposta deve tratar apenas do diesel e do gás de cozinha.

— Então vai se focar no óleo diesel e vamos ver que medida se toma também com o gás, porque é importantíssimo e atinge uma camada da população mais carente — afirmou, após se reunir com o ministro da Economia, Paulo Guedes.

O texto da proposta e a forma de encaminhamento ainda não estão fechadas pelo governo, mas é certo que ela será apresentada por um parlamentar aliado ao Palácio do Planalto, provavelmente o futuro líder do governo no Senado, Alexandre Silveira (PSD-MG), que toma posse nesta semana.

A ideia, com isso, é afastar a possibilidade do presidente Jair Bolsonaro ser acionado no Tribunal Superior Eleitoral, já que a redução de impostos pode ser vista como a concessão de benefício, o que é vedado em ano eleitoral. Por isso, inclusive, Bolsonaro tem destacado em suas falas que é o Congresso que deve apresentar a proposta.

As duas alterações em relação às ideias originais do Palácio do Planalto representam um alinhamento do texto ao Ministério da Economia e tentam vencer resistências às propostas no mercado, que teme um descontrole fiscal.

Inicialmente, a ideia do governo era permitir uma redução generalizada dos impostos federais sobre a gasolina, o diesel, o gás de cozinha e a energia elétrica por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

Agora, a intenção é fazer a redução do PIS/Cofins sobre o óleo diesel e para o gás por meio de um projeto de lei complementar. A mudança não é meramente de tramitação do texto.

Por mudar a Constituição, integrantes da equipe econômica temem que a PEC saia do controle do governo, autorizando uma série de despesas e alterando a regra do teto de gastos (a principal âncora fiscal do país). Além disso, não é possível vetar uma Proposta de Emenda à Constituição. A PEC não trata diretamente do teto de gastos, mas o risco da proposta ir por esse caminho pesou na avaliação do governo.

Ao reduzir os impostos por projeto de lei complementar, o governo afasta o risco de mudar o teto de gastos (já que ele está cravado na Constituição e não pode ser mudado por projeto de lei). Também consegue vetar trechos da proposta. Ao discutir o assunto por projeto de lei, o governo consegue blindar o teto de gastos.

Além disso, seria mais fácil avançar com a proposta. Aprovar uma PEC exige um apoio maior dos parlamentares (pelo menos 308 de 513 deputados e 49 de 81 senadores) enquanto o projeto necessita “apenas” da maioria nas duas Casas (pelo 257 deputados e 41 senadores).

Em todos os casos, o governo vai dispensar a necessidade de compensação. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) exige compensação, com aumento de receita ou corte de gastos, para a redução de impostos setoriais.

O PIS/Cofins sobre o diesel custa hoje R$ 0,33 por litro ao consumidor. O governo federal já havia zerado a Cide sobre o diesel em 2018. Se zerar o PIS/Cofins, deixa de arrecadar com a venda do combustível.

Se o governo optar pelo caminho de reduzir os impostos por meio de um projeto de lei, na prática, isso irá significar uma mudança na LRF para dispensar a necessidade de compensação.

De toda forma, a proposta vai permitir a redução “temporária” do ICMS sobre o diesel e sobre o gás de cozinha, também sem necessidade de compensação. Essa será, porém, uma decisão dos governadores.

A proposta de redução de impostos vem sendo modulada pelo governo desde que a ideia inicial do Palácio do Planalto foi revelada pelo GLOBO, há duas semanas. O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, já não fala mais na redução dos impostos sobre a gasolina, que teriam um custo muito elevado para a União.

Já foi descartada a ideia de criar um fundo para reduzir o preço dos combustíveis, como sugerem os governadores. A criação do fundo formado com recursos de dividendos da Petrobras e de royalties de petróleo sempre foi alvo de críticas dentro do governo e defendido principalmente pelos ministros Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e Bento Albuquerque (Minas e Energia).

Inicialmente, Guedes topou reduzir impostos federais sobre diesel, gasolina e energia elétrica, mas o custo elevado da medida (cerca de R$ 75 bilhões) fez o ministro mudar de posição. Ele passou a defender que o corte dos impostos seja feito apenas sobre o diesel e o gás de cozinha, com impacto de R$ 20 bilhões. É um custo menor e que cabe no Orçamento.

O preço do diesel é alvo de pressão dos caminhoneiros, que integram a base eleitoral do presidente.

Os ventos mudaram porque o governo chegou a conclusão de que um efeito de uma redução generalizada de impostos seria o inverso, podendo gerar impacto no aumento do dólar e, por fim, pressão inflacionária em outros itens, como nos alimentos.

Nesta semana, integrantes do governo devem conversar com lideranças partidárias e empresários para apresentar o projeto em busca de apoio e mostrar que não há um descontrole fiscal.

Fonte: O Globo