Divergências sobre parecer adiam votação da PEC dos combustíveis

 quinta, 30 de junho 2022

Divergências sobre parecer adiam votação da PEC dos combustíveis

Divergências sobre um possível “cheque em branco” inserido na proposta de emenda à Constituição (PEC) dos combustíveis - que eleva o valor do Auxílio Brasil, dobra o vale-gás e cria um novo benefício voltado para caminhoneiros - adiaram ontem a votação da matéria no Senado. Aexpectativa agora é que o texto seja submetido hoje ao plenário, a partir das 16h. Apesar da polêmica, o governo continua acreditando que a matéria será aprovada com “amplíssima maioria”.

O adiamento da votação foi pedido por diversos partidos, como PT, PSDB, Rede, MDB e Podemos. Os senadores dessas legendas demonstraram desconforto ao perceberem que a proposta continha um dispositivo que liberava operações de crédito de forma “desenfreada”. O item em questão foi inserido pelo relator da PEC, senador Fernando Bezerra Coelho (PL-RJ), justamente no artigo que regula o estado de emergência decorrente da crise dos combustíveis, subterfúgio usado para facilitar a criação do voucher dos caminhoneiros em ano eleitoral.

Este trecho dizia que a realização de operações de créditos ficaria ressalvada de “qualquer vedação ou restrição prevista em norma de qualquer natureza”. O item levou a bancada do PT a apresentar uma emenda supressiva, que excluiria essa frase da proposta. Por conta da reação, o próprio Bezerra anunciou que iria retirar o inciso do texto, mas, ainda assim, o episódio provocou críticas e deixou os senadores receosos com seu conteúdo.

“Era, sem dúvida nenhuma, um cheque em branco. Agora, a minha grande dúvida, neste momento, é se somente isso resolve e saneia a questão jurídica”, alertou o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM). Os senadores argumentaram, então, que tiveram poucas horas para se aprofundarem no parecer final. Isso porque o texto do relator do MDB só foi disponibilizado no fim da manhã de ontem.Ele lembrou também que, por conta da urgência, a PEC dos combustíveis não foi sequer analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.

“Fazer isso [aprovar uma PEC] com esse açodamento aumenta o risco de erros. Esse não é o melhor jeito de emendar a Constituição da República”, complementou Alessandro Vieira (PSDB-SE) ao pedir o adiamento da votação.

Em seguida, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), admitiu que, por se tratar de uma PEC, o tema merecia mais cuidado. “De fato, em se tratando de uma alteração constitucional, o passar de um dia, de dois dias, para que tenhamos segurança no texto em relação a uma alteração constitucional, acho absolutamente proveitoso”, argumentou.

Ainda que o assunto seja superado hoje, esta não é a única controvérsia a ser enfrentada na votação. O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), ameaça destacar uma emenda de sua autoria que sugere a criação de mais um benefício social no escopo da proposta: o “auxílio-gasolina”, que tem custo de R$ 3 bilhões e seria destinado aos motoristas de aplicativo, taxistas e pilotos de pequenas embarcações.

A ideia foi rejeitada por Bezerra Coelho, mas pode ser votada em separado. Nos bastidores, o governo trabalha contra essa emenda. Segundo um interlocutor, “não há espaço fiscal” para mais um benefício. “Estamos sendo muito responsáveis nesta conta”, disse o interlocutor.

Braga protestou diante da recusa do relator. “Não dá pra escolher entre profissionais A e profissionais B, todos têm que ser tratados de maneira igual. Estamos aprovando quase R$ 39 bilhões nessa PEC, por que não aprovar mais R$ 3 bilhões?”, questionou o senador do MDB.

A frase de Braga faz menção ao impacto fiscal previsto por Bezerra Coelho na PEC: R$ 38,75 bilhões, informação que foi adiantada pelo Valor. Todo esse montante ficará fora do teto de gastos e não estará vinculado a nenhuma receita da União. Com isso, na prática, o Executivo poderá abrir créditos extraordinários para custear essas medidas.

Para justificar o aumento de aproximadamente R$ 9 bilhões em relação ao impacto inicial da proposta (R$ 29,6 bilhões), Bezerra disse que a União está operando no positivo. Segundo ele, até abril deste ano, o resultado primário está calculado em R$ 139 bilhões. “Todos esses dados demonstram a compatibilidade financeira das medidas com as contas públicas federais”, explicou. Além disso, o relator citou que o governo poderá usar recursos que não estavam previstas no Orçamento, como a outorga da Eletrobras [R$ 26,6 bilhões] e dividendos [estimados entre R$ 20 bi e R$ 30 bi].

O substitutivo final também eleva o tíquete do Auxílio Brasil, que passará de R$ 400 para R$ 600, e zera a fila do programa social. Na prática, isso significa inserir mais 1,6 milhão entre os beneficiários do auxílio em 2022. Somente esta iniciativa terá um impacto de R$ 26 bilhões para os cofres do governo, aumento de R$ 4,4 bilhões em relação às projeções iniciais do próprio relator.

A PEC ainda traz a ampliação do vale-gás, que irá custar aproximadamente R$ 1,05 bilhão para o governo. Hoje, esse programa garante às famílias beneficiadas o direito, a cada bimestre, a um valor monetário de 50% do preço médio de revenda do botijão de GLP. Com a nova proposta, a União iria subsidiar 100% do preço a cada dois meses, cerca de R$ 120.

Por fim, a PEC cria o voucher para caminhoneiros, sob custo estimado de R$ 5,4 bilhões. O benefício terá valor de R$ 1 mil e será destinado apenas aos caminhoneiros autônomos. Bezerra abandonou a ideia de estender essa proposta às empresas.

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https://valor.globo.com/politica/noticia/2022/06/30/divergencias-sobre-parecer-adiam-votacao-da-pec-dos-combustiveis.ghtml

Fonte: Valor Econômico