BC eleva taxa básica de juros para 6,25%. Entenda o impacto na economia na visão de 4 analistas

 quinta, 23 de setembro 2021

BC eleva taxa básica de juros para 6,25%. Entenda o impacto na economia na visão de 4 analistas

O Banco Central cumpriu as expectativas do mercado e elevou, nesta quarta-feira, a taxa básica de juros em um ponto percentual. A Selic passou de 5,25% ao ano para 6,25%.

Para analistas ouvidos pelo GLOBO, a expectativa é que a autoridade monetária tenha que continuar subindo os juros no próximo ano para conter a alta dos preços.

A missão do BC é converter a inflação ao centro da meta estabelecida a cada ano. Mas o IPCA acumulado nos últimos 12 meses está bem acima.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem indicado que a autoridade monetária perseguirá a redução da inflação mantendo um ritmo gradual de elevação dos juros.

A natureza do atual processo inflacionário, fortemente influenciado pela desvalorização do real frente ao dólar e pela alta de commodities, pode limitar o efeito do remédio.

No entanto, a elevação dos juros tem repercussões para além da inflação. Afeta o custo do crédito, os rendimentos de aplicações financeiras, investimentos das empresas e até a geração de empregos.

Veja a seguir a visão de 4 analistas de mercado sobre o impacto da nova alta dos juros:

Alta de juros afeta a atividade econômica

Felipe Sichel, estrategista-chefe do Modalmais
O aumento da taxa básica de juros é necessário para conter a alta dos preços. No entanto, pode ter efeitos negativos no crescimento econômico, alerta Felipe Sichel, estrategista-chefe do Modalmais.

Enquanto isso...Fed define taxa de juros hoje. Em vez de inflação, desafio do banco central dos EUA é o ‘emprego inclusivo’

Para ele, o movimento de retração da atividade econômica como consequência de uma Selic mais alta é "quase mecânico".

— Na medida em que a Selic estará acima do seu nível neutro, o objetivo da autoridade monetária é retirar estímulos da demanda agregada da economia. Ou seja, teremos menos PIB ao longo do tempo — aponta Sichel, que projeta uma Selic de 8,5% no primeiro trimestre do ano que vem, dado o avanço nas expectativas de inflação.

Bilionário no centro da crise:Quem é Hui Ka Yan, o chinês criado pela avó que vendia vinagre na infância e construiu o império Evergrande

'BC tenta suavizar o ciclo econômico'

Rafael Cardoso, economista-chefe do Banco Daycoval
Rafael Cardoso, economista-chefe do Daycoval Asset, acredita que o Banco Central seguira elevando os juros até o início de 2022 para combater a inflação.

— A gente não esperava que a decisão em si tivesse surpresa, mas o reconhecimento do Banco Central de uma piora qualitativa da inflação, tanto em termos inerciais (tanto da inflação corrente) quanto das expectativas. Com a piora (da inflação), a gente vai ter que seguir durante mais tempo com esse aperto monetário – avalia.

Para ele, a postura mais conservadora do BC na elevação dos juros, apesar da piora da inflação, está relacionada com a recuperação da atividade econômica:

— O BC ponderou o quanto ele teria de ser duro para atingir a meta no ano que vem frente o curso que isso teria para a atividade econômica. O que ele está fazendo é colocar o regulamento embaixo do braço e tentar suavizar o ciclo econômico, de forma que a inflação no ano que vem não degringole, mas você também não mate a economia no meio de uma recuperação.

Inflação deste ano 'não tem como ser controlada'

Rachel de Sá, chefe de Economia da Rico
Chefe de economia da Rico, Rachel de Sá afirma que a disseminação da inflação para além dos bens e serviços afetados por problemas na oferta tem feito com que o mercado projete um aumento prolongado da taxa de juros.

Segundo a analista, a continuidade da crise hídrica, com a bandeira vermelha se estendendo até abril, e a deterioração do cenário fiscal no país fazem com que a inflação se afaste cada vez mais da meta. 

— Nossa projeção é que essa pressão inflacionária fará com que a Selic encerre o ciclo em 8,5%. E uma taxa de juros acima do nível neutro de 6,5% desestimula a economia e tem impactos no PIB.

Para Rachel, o objetivo do Banco Central com o aumento dos juros não é conter a inflação deste ano, que "não tem como ser controlada", mas sim evitar que esse cenário permaneça em 2022.

— Ainda levará um certo tempo para sentirmos o impacto das ações do Banco Central na vida real, nos preços correntes. Mas há fatores que não dependem da política econômica, como as condições climáticas que levaram à crise hídrica, então há um limite para o que o BC pode fazer.

BC precisa convencer o mercado do controle da inflação

Marco Caruso, economista-chefe do Banco Original
Na avaliação de Marco Caruso, economista-chefe do Banco Original, o desafio do Banco Central agora é convencer o mercado do compromisso com o controle da inflação, já que essa decisão reverbera no indicador de 2023. 

— O grande segredo desse comunicado é que o Banco Central precisa persuadir o mercado de que está totalmente comprometido em manter a inflação em patamares baixos no ano que vem — avalia, frisando que esse comunicado duro serve para conter a elevação das projeções de inflação. 

Ele diz que o mercado já absorveu a mensagem de que reduzir a inflação para a meta de 2022 teria um custo muito alto para o BC, e que é por isso que já se começa a olhar para o indicador de 2023. 

— Ele vai começar a dar um peso um pouco maior para duas coisas. Uma é que a gente pode ver uma piora em como ele qualifica o crescimento econômico para o ano que vem e para a inflação de 2023. A rodada de decisão dele hoje já está mirando a inflação de 12 a 18 meses à frente. 

Caruso reforça que a elevação de juros é o que precisa ser feito no momento para conter a elevação inflacionária, muito pressionada por uma sequência de choques diferentes na pandemia, que bagunçou os preços. 

A nova elevação da Selic praticamente retoma o patamar de 2019, e esvazia parte do discurso do governo dos juros mais baixos da história. E há uma preocupação eleitoral nisso: 

— É muito mais danoso para a popularidade estar num país de inflação alta do que juros alto. A inflação você sente direto no seu bolso, o juro é indireto.

Fonte: O Globo