Após resultado do PIB, analistas revisam projeções e já preveem crescimento de até 5,5% da economia

 quarta, 02 de junho 2021

Após resultado do PIB, analistas revisam projeções e já preveem crescimento de até 5,5% da economia

A alta do PIB no primeiro trimestre do ano, de 1,2% na comparação com o registrado no quarto trimestre de 2020, foi superior às projeções do mercado e fez com que os analistas revisassem para cima as suas projeções de crescimento da economia para este ano.

O otimismo com a retomada, contudo, ainda é modulado devido a incertezas como os efeitos da terceira onda da pandemia, o ritmo lento de vacinação contra o coronavírus e a crise energética vivenciada pelo país.

Entre os mais otimistas, está o banco Goldman Sachs, que revisou sua previsão de crescimento para o PIB do país neste ano de 4,6% para 5,5%.

Em seu relatório, a instituição financeira diz que a estimativa considera que não haverá cortes no fornecimento de energia e que espera melhora nas atuais limitações na cadeia de suprimentos (e consequentemente na escassez de matérias-primas) e maior controle da pandemia a partir do segundo semestre.

O economista Alberto Ramos, que assina o relatório, destaca que, mesmo que atividade econômica se mantenha no atual patamar até o fim do ano, o país crescerá 4,94% em 2021 só por efeito estatístico, o que os economistas chamam de carry-over.

Alessandra Ribeiro, sócia-diretora da área de macroeconomia da Tendências, vê com menos otimismo o cenário para este ano. A consultoria deve revisar sua estimativa de crescimento do PIB para este ano de 4% para 4,2%.

– Temos riscos importantes, como a terceira onda da pandemia, e a incerteza do ritmo de vacinação mais lento. Nosso cenário-base previa em julho ou agosto com 40% da população adulta vacinada, mas maio fechou bem abaixo da expectativa – afirma Riberiro.

Ela acrescenta:

– A maior surpresa no PIB do primeiro trimestre foi a formação bruta de capital fixo (indicador de investimentos), que veio acima do que esperávamos, com 4,6%. Teve um efeito de plataformas de petróleo nestes primeiros meses do ano, mas a performance veio impulsionada por bens de capital, ligados à agropecuária e a transportes, além de construção civil.

Para a economista a reabertura da economia depende de se chegar ao fim do ano com 70% da população adulta vacinada. Para ela, a crise hídrica deve afetar o custo da energia, mas sem o risco de uma crise similar à de 2001, com racionamento:

– Mas teremos uma energia mais cara e riscos de blackouts mais localizados, que limitam crescimento econômico.

Reposição de estoques impulsionou atividade, diz economista da XP
Rodolfo Margato, economista da XP, ressalta que a reposição de estoques na indústria foi um componente importante para o desempenho positivo da atividade econômica neste início de ano.

Ele lembra que o setor industrial encerrou o ano com estoques muito baixos, em razão da demanda elevada por bens industriais além do que era esperado pelas cadeias industriais.

— Pelo lado da demanda, o PIB não teria crescido tanto e poderia ter tido até resultado negativo não fosse essa variação bastante positiva dos estoques. Por outro lado, vale a pena dizer que nos trimestres de 2020 a gente viu o contrário: um consumo de estoques bem rápido que levou a essa necessidade de recomposição.

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Ele pontua, porém, que essa recomposição de estoques não deve se sustentar nos próximos meses. Por outro lado, ele observa melhor adaptação de empresas e famílias ao cenário de pandemia.

Por conta disso, a XP está revisando sua projeção de 4,1% para o PIB para algo entre 4,5% e 5%, diz Maragato:

— Sabemos que infelizmente a segunda onda se mostrou mais severa, mas o choque oriundo dessa vez foi menor. O cenário nublado para o PIB há alguns meses, por conta do impacto da pandemia na atividade, está ficando mais claro e o crescimento mais forte — diz ele.

Alta nos investimentos foi afetada por preços, aponta Vale
Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, o resultado do PIB veio melhor que o esperado, mas muito influenciado pelo bom desempenho do agronegócio e pelo investimento. A alta deste último, porém, segundo o analista, tende a ser pontual:

– Os investimentos tiveram forte impacto da alta de preços, o que é pontual. Os preços de capital, quando vemos segmentos como construção, máquinas e equipamentos, tiveram alta por fatores como câmbio e dificuldade na obtenção de matéria prima, especialmente aço e minério de ferro. Esse cenário não é sustentável – diz Vale.

A MB revisou sua projeção para o PIB de 2021 de 3,2% para 4,1%.

– Temos alguns pontos de preocupação que evitam uma revisão mais otimista. Uma delas é sobre o efeito da terceira onda da pandemia. A crise de energia também tende a trazer restrição de demanda, e, com a inflação ainda em alta, é possível que a Selic (taxa básica de juros) suba para 6,5% ainda neste ano, o que tende a afetar a economia – ressalta Vale.

CNC ainda vê consumo limitado
O Banco Inter revisou a expectativa de PIB de 4,2% para 4,8% para 2021. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) também ampliou sua projeção de alta do PIB (de 3,2% para 3,8%), mas vê com preocupação uma possível retração do consumo das famílias nos próximos trimestres.

– O impacto da segunda onda da pandemia sobre o nível de atividade foi menos acentuado que o da primeira, mas neste trimestre o consumo das famílias já caiu um pouco, 0,1%. Isso mostra que há sim um resultado negativo da pandemia sobre a atividade econômica – diz Fabio Bentes, economista da entidade, para quem a agropecuária salvou o resultado da economia.

Analista da Rio Bravo revisou projeção para 5,4%
Para João Leal, economista da Rio Bravo Investimentos, os resultados da agropecuária, da indústria e dos investimentos vieram acima do esperado, mas o consumo das famílias também foi surpresa positiva, segundo ele.

Era esperado uma retração de 0,8% por muitos economistas por conta da interrupção do auxílio emergencial nos três primeiros meses do ano, observa o analista.

— No começo do ano esperávamos uma recessão técnica para os dois primeiros trimestres e isso mudou completamente. Mesmo com a queda mais intensa do varejo, o consumo das famílias se manteve e tudo isso deixa um carrego muito positivo. Esperamos 0,2% no segundo trimestre, estamos mais otimistas que o mercado em geral — diz Leal.

A projeção para o ano da Rio Bravo subiu de 4,5% para 5,4%. Leal acredita que o avanço da vacinação pode impulsionar a retomada da maior participação do setor de serviços, setor que mais emprega e que encolheu desde o ano passado.

Por enquanto, afirma ele, estamos sob uma “tempestade perfeita”: inflação elevada, recuperação desigual da economia e grande estoque de pessoas fora do mercado de trabalho.

Bradesco aponta maior resiliência de famílias e empresas
O Bradesco atualizou sua estimativa de 3,3% para 4,8%. Fernando Honorato, economista-chefe do banco, também vê nos dados do primeiro trimestre uma resiliência da economia maior que a esperada:

– As famílias e as empresas aprenderam a lidar com a pandemia. Houve mais mortes na segunda onda, mas o impacto econômico foi bem menor, como reflexo desse aprendizado. A mobilidade caiu menos também – explica.

O ciclo de alta no preço de commodities e a alta nas contratações no mercado formal, segundo ele, ajudam a dar impulso econômico ao país, especialmente em setores ligados ao agronegócio.

Entre os riscos, no entanto, Honorato coloca as incertezas em relação a uma terceira onda da pandemia e o baixo nível dos reservatórios de hidrelétricas.

FGV mantém previsão de 3,5%
Cláudio Considera, coordenador do Núcleo de Contas Nacionais da FGV, afirma que ao contrário do mercado, a instituição esperava um crescimento até maior no primeiro trimestre.

A projeção do monitor do PIB da FGV era de 1,7% de crescimento em relação ao trimestre anterior, e 1,6% na comparação com o primeiro trimestre de 2020.

Para o ano, projeção é de 3,5%, menos otimista do que o mercado, que espera em média um crescimento entre 4% e 5%. O pesquisador diz que a FGV não deverá fazer revisões na projeção do PIB deste ano por enquanto:

— Enquanto não tivermos pelo menos 70% da população vacinada, vai ser assim: os governos relaxam as medidas restritivas, a economia melhora, mais pessoas morrem, aí aumentam as restrições, a economia piora. Esse ainda é um crescimento sobre uma base muito fraca, não vejo muita vantagem. Mesmo que o país cresça 4% este ano, como algumas projeções sugerem, vai apenas recuperar os 4,1% que perdeu no ano passado.

Itaú observa que há riscos para o agronegócio
Já Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco, afirma que o PIB do primeiro trimestre veio acima do que o banco esperava, que era uma alta de 0,6%. Apesar disso, a instituição também não deve alterar, a princípio, a estimativa do PIB para o ano, de crescimento de 5%.

— Achamos que a agropecuária pode cair no segundo trimestre, para quando esperamos um PIB com alta mais fraca, de 0,2%. Para os dois últimos trimestres, nossa expectativa é de altas de 1% em média — explica Barbosa.

Em relação ao comércio, ele acredita que a expansão do crédito e as taxas de juros baixas podem ter ajudado a aumentar o poder de compra da população. O economista ressalta que o desemprenho do PIB ainda não tem relação com uma política econômica sustentável:

— É uma recuperação cíclica depois da queda que aconteceu no auge da pandemia. Está só voltando para o nível pré-crise. O crescimento nos próximos meses está condicionado ao avanço da vacinação e ao retorno da política fiscal do teto de gastos.

CNI vê restrições para expansão da indústria
Para Marcelo Azevedo, gerente de análise econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), uma das preocupações do segmento para o resto do ano é com a regularização no fornecimento de insumos como semicondutores, o que ainda não ocorreu.

Montadoras como General Motors e Volkswagen precisaram parar a produção por escassez de suprimentos.

– A indústria de transformação já teve queda no primeiro trimestre por causa disso. Construção e serviços de utilidade pública também sofrem impacto da falta de insumos. Ainda não é um quadro preocupante, mas merece alguma atenção – afirma.

Azevedo diz que a vacinação ainda é o fator fundamental para definir o ritmo de retomada da atividade:

– O mercado de trabalho, especialmente o informal, depende demais da vacinação porque é muito ligado a serviços e à abertura da economia. Se a renda não se recupera e o comércio tiver atividade limitada com a eventual piora da pandemia, isso impacta negativamente a indústria.

Fonte: O Globo