Indústria resiste a propostas de Bolsonaro para os combustíveis

 segunda, 17 de fevereiro 2020

Indústria resiste a propostas de Bolsonaro para os combustíveis

Alertado por assessores para o fato de que o preço do gás e dos combustíveis afeta sua popularidade, o presidente Jair Bolsonaro passou a incluir o tema em suas falas públicas, entrevistas e postagens nas redes sociais. A avalanche de propostas, porém, causou desconforto no setor, que resiste a algumas delas.

O presidente colocou o tema em seu radar após receber monitoramento informal de sua equipe nas redes sociais, que detectou aumento no número de publicações questionando as altas de preços, em especial da gasolina, que tem se mantido acima dos R$ 4 por litro na maior parte do país.

O tema passou a ser abordado por políticos da oposição e apoiadores, que circulam memes comparando os preços nos governos Dilma e Bolsonaro. Na última semana, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) publicou em uma rede social uma espécie de pesquisa “informal”: “Quanto está a gasolina na sua cidade?”.

Diante de reações como essa, o presidente foi aconselhado a intensificar o discurso de que não tem autonomia para influenciar preços. Tem falado sobre isso com apoiadores que o esperam diariamente na porta do Palácio da Alvorada e, na sequência, reforça a mensagem aos jornalistas. ?

Há duas semanas, disse em entrevista que estava “fazendo papel de otário” ao baixar o preço da gasolina nas refinarias, já que o repasse não chegava aos consumidores, mesmo após quatro cortes de preços promovidos pela Petrobras.

Desde o início do governo, o preço da gasolina nas bombas subiu 5,77%; o diesel teve alta de 9,79%; o etanol avançou 14,84%; e o botijão de gás ficou estável. Considerando a inflação, as variações são de 1,10%, 4,89%, 9,80% e queda de 3,59%, respectivamente.

Os aumentos foram influenciados principalmente por crises internacionais, com a guerra comercial China-EUA, no início de 2019, o ataque a refinaria na Arábia Saudita, em setembro, e o assassinato do general iraniano Qassim Suleimani, no início do ano.

Depois, a cotação do petróleo despencou com temores sobre impactos econômicos do surto de coronavírus.

“Se não chega ao consumidor [a queda dos preços], a gente está dando varada na água. Eu estou mostrando que a responsabilidade do preço do combustível é minha e dos governadores também”, reclamou o presidente.

“Eu zero o federal se eles zerarem o ICMS. Está feito o desafio aqui agora. Eu zero o federal hoje, eles zeram o ICMS. Se topar, eu aceito. Tá ok?”, disse ele, detonando uma campanha de cobranças aos governadores em redes sociais.

Em reunião na semana passada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou acalmar os ânimos ao propor que o debate seja levado ao Congresso na discussão da reforma tributária e do pacto federativo.

Mas a estratégia tem gerado desconforto também entre as empresas do setor, que vêm discutindo medidas com a área técnica do governo desde o início do mandato. A percepção é que as declarações de Bolsonaro atrapalham o debate e colocam também distribuidoras e postos de combustíveis na lista dos vilões.

O presidente tem declarado apoio a medidas regulatórias que não são unanimidade, como a venda direta de etanol das usinas para os postos –projeto patrocinado por produtores do Nordeste, mas com oposição no centro-sul.

Em janeiro, levados pelo presidente da Embratur, Gilson Monteiro, representantes dos produtores nordestinos estiveram com Bolsonaro e saíram com a percepção de que a decisão por liberar a venda direta já foi tomada. Na quinta (13), o empresário Rubens Ometto, um dos maiores do setor e opositor da ideia, também esteve com Bolsonaro.

A proposta esbarra em questões tributárias, já que a venda direta eliminaria a parcela dos impostos cobrados na distribuição. Os efeitos, porém, são visto como limitados, já que beneficiaria apenas postos próximos a usinas.

Na semana passada, o presidente disse que o mercado de gás de botijão também entrará no foco. Afirmou ter determinado estudos para permitir o aumento no número de engarrafadores de botijões no país, para evitar as viagens dos vasilhames até as engarrafadoras.

Bolsonaro não deixou claro se apoia a proposta de permitir o enchimento parcial ou o uso de botijões de outras marcas, medidas que têm oposição de grandes empresas.

Fonte: Folha de S. Paulo