Após mais de um mês, deputados aprovam ‘Orçamento de Guerra’

 terça, 05 de maio 2020

Após mais de um mês, deputados aprovam ‘Orçamento de Guerra’

Depois de mais de um mês de negociações, a Câmara dos Deputados aprovou ontem, em primeiro turno e por 481 votos a 4, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que cria o chamado Orçamento de Guerra. O texto flexibiliza temporariamente regras fiscais para facilitar gastos emergenciais durante acrise do coronavírus. Além de facilitar ações de combate à pandemia, o regime especial permitirá que o governo injete R$ 36 bilhões em fundos garantidores para destravara liberação de crédito a empresas. O projeto também abre caminho para o rep assede R $60 bilhões a estados e municípios, ainda em análise pelo Congresso.

A Câmara já havia dado aval a um aversão anterior do projeto no início de abril, masa redação foi alterada pelo Senado. P orisso, precisou passar novamente pela análise dos deputados. Até anoite de ontem, a matéria ainda precisava ser votada em segundo turno.

Um dos principais pontos da proposta é liberar o governo, temporariamente, do cumprimento da chamada regra de ouro. A trava fiscal impede que a União se endivide para pagar despesas correntes, como salários. Com o relaxamento provisório, o Tesouro Nacional pode recorrer mais livremente ao mercado financeiro para buscar recursos.

AJUDA A ESTADOS

Esse é o ponto do texto que abre espaço para novos gastos, que ainda não saíram do papel. Dos R$ 36 bilhões para crédito, R$ 15,9 bilhões serão aportados no Fundo de Garantia de Operações (FGO), gerido pelo Banco do Brasil e que poderá ser usado por vários bancos no socorro a micro e pequenas empresas enquadradas no Simples Nacional. Os R$ 20 bilhões restantes serão aportados no Fundo Garantidor para Investimentos (FGI), do BNDES, para empresas de médio porte. Segundo estimativas da área econômica, a entrada do Tesouro nas operações poderá alavancar de R$ 118 bilhões a R$ 120 bilhões em empréstimos.

O Congresso já aprovou o projeto que trata dos financiamentos para micro e pequenas empresas com aval do Tesouro, mas a sanção presidencial estava condicionada à aprovação do Orçamento de Guerra. Segundo técnicos, o texto deve ser sancionado junto com a regulamentação da linha de financiamento.

Com a regra em vigor, negócios que faturam até R$ 4,8 milhões por ano terão acesso a empréstimos equivalentes a até 30% do faturamento que registraram no ano anterior. O dinheiro do Tesouro é necessário porque empresas menores não têm garantias em um momento em que bancos estão mais seletivos, por medo de calotes causados pela crise. O contato com as empresas que têm direito ao crédito será feito pela Receita Federal, que tem o cadastro do Simples Nacional, explicou um técnico.

A situação das empresas maiores é diferente. Essas companhias têm garantias, mas enfrentam problemas de fluxo de caixa. Nesse caso, os recursos federais serão um reforço a mais no sentido de estimular as instituições financeiras a ajudarem na travessia da crise.

A preocupação maior, explica um técnico, é manter viva a extensa cadeia produtiva, o que pode ser feito via financiamento de capital de giro das principais empresas. Entram no radar a Embraer, indústria automotiva, varejo, além de companhias aéreas. A avaliação de integrantes do Ministério da Economia é que está havendo uma deterioração muito rápida da atividade econômica e que, se o governo deixar a cadeia produtiva dos grandes setores morrer, a retomada ficará cada vez mais distante.

Segundo o relator da PEC, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), a aprovação do texto também será fundamental para assegurar a liberação dos R$ 60 bilhões prometidos pela União a estados e municípios.

— A PEC é fundamental porque, neste momento, o governo precisa tomar medidas orçamentárias para auxiliar o Ministério da Saúde e combater o coronavírus. A aprovação também serve para o socorro aos estados e municípios. Só podemos votar esse auxílio com a PEC, já

que haveria impedimentos para a liberação (de dinheiro) com as travas do teto de gastos e da regra de ouro — diz Hugo Motta.

MENOS AMARRAS AO BC

A proposta aprovada ontem também amplia a capacidade do Banco Central (BC) de atuar diretamente no mercado. De acordo com o texto, a autoridade monetária poderá comprar títulos públicos e privados de crédito no mercado secundário.

Antes da última votação, Motta fez duas modificações nas regras sobre a atuação da autoridade monetária. Primeiro, suprimiu a previsão de que empresas beneficiadas pelos operações realizadas pela autarquia se comprometam a manter os empregos. Além disso, retirou o trecho que especificava quais tipos de títulos privados de crédito a instituição poderá comprar. Dessa maneira, o órgão poderá atuar no mercado de maneira mais ampla.

Foram mantidas, no entanto, as restrições impostas quando a matéria foi analisada no Senado. Na ocasião, o relator do projeto na Casa, senador Antonio Anastasia (PSD-MG), estabeleceu critérios como a obrigação de que o BC só possa comprar títulos que tenham qualidade mínima aferida por agências de classificação de risco. Além disso, as instituições financeiras que venderem esses títulos para a autarquia não poderão distribuir lucros e dividendos acima do mínimo estabelecido por lei.

As mudanças envolvendo o BC foram o principal motivo de divergências e atrasaram a tramitação da PEC. A ideia foi apresentada pela autoridade monetária para possibilitar ações mais eficazes no combate aos efeitos econômicos da pandemia. O volume de recursos parados, após algumas medidas de estímulo ao crédito anunciadas pela equipe econômica, tem sido alvo de críticas, já que o dinheiro não têm chegado na ponta.

Ainda com esse objetivo, a PEC também passou a contar, desde que passou pelo Senado, com uma flexibilização da regra que proíbe que empresas com dívidas previdenciárias obtenham crédito com garantia da União.

A mudança foi proposta pelo governo para viabilizar a medida que prevê a concessão de R$ 40 bilhões em empréstimos para pagar salários de funcionários de pequenas e médias empresas. Desse montante, R$ 34 bilhões serão garantidos pelo Tesouro Nacional. Ou seja, o governo assume a maior parte do risco das operações. Para se ter uma ideia do efeito do impedimento constitucional, só nos estados do Rio e de São Paulo, há mais de 530 mil inscrições na dívida ativa por causa de débitos previdenciários.

Fonte> O Globo